CIEN SANTA CATARINA Resenha – Noite do Cien de 31/05/17
Jussara Jovita Souza da Rosa
Esta Noite, contou com a presença da Psicanalista e Doutora em Psicologia Adriana Rodrigues, que nos brindou com um recorte feito de sua tese de Doutorado, intitulada “A psicanálise e a política de assistência social brasileira: um diálogo possível?”
No trabalho de consolidação do Cien em Santa Catarina, o recorte em torno da psicanálise aplicada foi o que nos moveu para a realização dessa atividade, orientada pelo título: Entre o “ouro puro da análise” e o “cobre da sugestão direta”: algumas considerações sobre a psicanálise aplicada, em Freud e Lacan. Advertidos de que é para além das paredes dos consultórios que os impasses se presentificam, a conversa nos deu oportunidade de pensar ainda mais acerca da relação da psicanálise com outras disciplinas, no âmbito de Instituições, bem como os impasses que daí podem advir.
Um impasse que se apresentou às atividades do Cien em Santa Catarina se relaciona com a compreensão do que é um laboratório. Nosso laboratório em formação, o Encontro de saberes em inter-disciplinaridade com a educação, iniciou com a demanda de um Núcleo de Educação Infantil da rede municipal, no ano de 2013. No ano de 2015 a demanda de uma ONG que atende crianças e adolescentes no contra turno escolar nos levou a considerar a formação de outro laboratório, em conversa com a coordenação nacional e recebemos a orientação de trabalharmos mantendo as conversações ligadas ao laboratório já inscrito. No final do ano de 2016 e agora no ano 2017, temos recebido demandas de outras unidades escolares, que tem resultado em conversações, cujas queixas giram em torno da agitação dos corpos infantis e adolescentes das dificuldades das instituições com as famílias. Esse impasse continua em tratamento no laboratório em formação, estamos ainda no tempo de compreender o que é um laboratório, e essa resposta não será encontrada em manuais, mas com trabalho. Trabalho que tem se feito com as conversações, com as atividades abertas do Cien, com o Cine Cien, na pesquisa da interdisciplinaridade entre psicanálise-educação. Trata-se de algo a ser inventado.
A metáfora freudiana: Entre o ouro… e o cobre, é utilizada para pensar a diferença entre a psicanálise praticada no consultório, e a que se lança para fora dele, mas a rigor trata-se de uma única psicanálise com suas aplicações. No caso do Cien, há um saber que se impõe que não tem uma causalidade, nem uma exatidão, mas que como bem marcou Ana Lúcia Lutterbach Holck (2016), baseada em Miller, pode ser transmitido num esforço de poesia, pois a pesquisa do Cien precisa reverberar também na Escola, e não só nos espaços onde se fazem as conversações.
Adriana Rodrigues ressalta que Freud pensando na aplicação da psicanálise nas instituições, (FREUD, 1925), demarcou o que denominou de “pedras de espera no canteiro de obras psicanalítico”, o que estava relacionado aos seguintes aspectos: o “interesse vivo” do praticante da psicanálise; a formação do analista; a psicanálise como um discurso auxiliar; a definição de situação analítica ou da sua impossibilidade; e na impossibilidade, a criação algo diferente da análise, mas com a mesma intensão. (FREUD, 1925).
No “Ato de Fundação” ([1964] 2003), Lacan descreve a organização da sua Escola fazendo uma divisão, para fins práticos, entre três seções: Seção de Psicanálise Pura, Seção de Psicanálise Aplicada e Seção de Recenseamento do Campo Freudiano. Na “Proposição de 9 de outubro de 1967”, Lacan destaca que à psicanálise em extensão cumpre a função de presentificar a psicanálise no mundo.
O Cien condensa esses aspectos, é uma “pedra de espera” e cumpre essa função de presentificar a psicanálise no mundo.
Essa presença no mundo deve ser operada de forma distinta das psicoterapias, ou seja, pela […] orientação ao real, e não à realidade – real que, […] tende a se desvelar com mais intensidade longe do divã.” (RODRIGUES, 2016)
Real que porta o impossível, mas também a invenção. Sobre o impossível e a invenção, Adriana Rodrigues nos apresenta uma consideração de Eric Laurent:
“Precisamos nos introduzir em uma tolerância com relação ao impossível, sem ceder nem à resignação, nem ao cansaço, diante de uma carreira que concerne ao impossível. Isso implica uma modéstia ativa [grifo nosso] dos políticos, dos terapeutas, dos psicanalistas, psiquiatras e de todos os que estão envolvidos nessa carreira multidisciplinar, a modéstia de como abordar este impossível em todas as suas facetas.” (LAURENT, 2011, p.61).
Uma modéstia ativa para abordar o impossível, essa elaboração de Eric Laurent, nos trouxe uma orientação significativa para a nossa interlocução com os espaços institucionais representados em nosso laboratório, nos convocando a inventos, também no que se refere ao que nos é possível em torno da formação do nosso laboratório, com a singularidade do que há construído em torno do campo freudiano em nosso espaço de presença em Santa Catarina. Não há roteiro, mas há orientação. Não há roteiro, mas há possibilidade de invenções, e nossa prática em torno do Cien, tem permitido ver que um laboratório não se constitui de forma efêmera. O importante é poder estreitar a conversa com os que se encarregam da infância e da adolescência, o que é de muito efeito para a psicanálise.
“A pergunta que o praticante da psicanálise precisa responder num trabalho em instituição é se a psicanálise pode servir para orientar os demais discursos em seus pontos de impasse, ali onde as tentativas fracassam, mas demandas se repetem e o trabalho não avança. Se for possível, não é necessário que sejam muitos os praticantes da psicanálise, mas que sejam “trabalhadores decididos”” (LACAN [1964] 2003, p.239.
Por nos trazer essa elaboração em torno da psicanálise aplicada e da psicanálise em extensão, temas que atravessam nossa prática e que precisamos trabalhar visando a consolidação do Cien em Santa Catarina, essa pesquisa trouxe no recorte levado para a conversa, grande contribuição para os “trabalhadores decididos” do Cien em Santa Catarina, num tempo em que temos sido convocados a pensar as “transformações no laço social”.
Por nos trazer essa elaboração em torno da psicanálise aplicada e da psicanálise em extensão, temas que atravessam nossa prática, se aproximam e se distanciam do trabalho nas conversações de um laboratório, e que pretendemos trabalhar visando a consolidação do Cien em Santa Catarina, essa pesquisa trouxe no recorte levado para a conversa, grande contribuição para os “trabalhadores decididos” do Cien em Santa Catarina, num tempo em que temos sido convocados a pensar as “transformações no laço social”.