Laboratório Criar (em formação) – CIEN-SP - Eduardo Vallejos O Centro Interdisciplinar de Estudos sobre…
Construções Adolescentes
Virgínia Carvalho
Freud indica a “construção” como uma estratégia para lidarmos com o que a palavra não é capaz de dizer. Ele evoca o trabalho do arqueólogo que precisa reconstruir culturas e sociedades antigas unindo os vestígios materiais que encontra. Diante de peças soltas, inventa uma coerência para que elas constituam um todo.
A saída da infância, demarcada pela chegada da puberdade – encontro com um “novo real”, desestabiliza a coerência que a criança havia conquistado para se arranjar com suas peças soltas infantis. São as “transformações da puberdade”, como diz Freud (1905/1996) em seus Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade, que demandam do sujeito um modo diferente de lidar com a libido, de se reposicionar frente à diferença sexual e se reencontrar com o objeto sexual.
Na puberdade, como esclarece Lacan (1974/2003), o sujeito está às voltas com o despertar de seus sonhos. E, nesse momento, em que estão explícitos os limites da linguagem, pois a sexualidade faz furo no real, a adolescência vai sendo construída a partir dos recursos que cada um encontra para rearranjar o que se desestabiliza nesse encontro.
Mas, em tempos de “mutações da ordem simbólica” (MILLER, 2014), em que o saber está no bolso, como os jovens tem encontrado coerência para enodar suas peças soltas? E os profissionais concernidos, de que modo tem intervindo diante de construções devastadoras ou mortíferas?
Marina Saleme, Garotas (as descabeladas), 2013
Vivemos no “império das imagens”, onde há uma “difusão maciça” do pornô, do coito exibido a um clique, do “nude” compartilhado pelo telefone entre os jovens. Quais os efeitos dessa mostração dos corpos e do sexo nessas construções realizadas pelos adolescentes?
Jacques Allain Miller (2015) localiza que para pensarmos a adolescência na psicanálise, convém nos ocuparmos de três pontos: a saída da infância, a diferença dos sexos e a antecipação da posição do adulto na criança.
Nesses tempos de “império das imagens”, o que tem demarcado a saída da infância? Teria se antecipado em relação à época de Freud?
E a diferença dos sexos? Como essa questão e seus desdobramentos se apresentam para os jovens nesse tempo em que aumentam as ofertas da tecnociência para transformar a anatomia? Além disso, tem a pluralidade de gêneros interferido no modo desses adolescentes se posicionarem na partilha sexual?
E no trabalho com a criança? Como a posição frente aos “mais inflamados tormentos da infância” antecipam a construção que se fará na adolescência?
Seguindo a trilha da provocação feita por Miller, essas e outras questões tem sido levantadas pelos Laboratórios do CIEN. A partir delas, parece-nos de grande importância tentarmos localizar, nas atividades do CIEN, essa dimensão de construção que a adolescência comporta.