Anna Aromí Gostaria de agradecer à Nohemí Brown, por embarcar nessa sua aventura, do outro…
Dentro e Fora
Fernando Prado1
Resumo
O texto a seguir é o resultado de um diálogo entre um matemático e uma psicanalista. Sem nenhuma pretensão de rigor cientifico, o autor estabelece um paralelo entre conceitos da teoria das probabilidades e independência entre indivíduos.
Um dos conceitos mais importantes da teoria das probabilidades é o da independência de eventos. Dizemos que dois eventos A e B são independentes se, dado a informação sobre a ocorrência de um evento, não for possível obter mais informação sobre a ocorrência do outro. Por exemplo, considere o lançamento de duas moedas. Vamos denotar o resultado desse experimento por (x, y), sendo x o resultado da primeira moeda, e y, o da segunda. Para facilitar a notação, suponha que (x, y) = (1, 0) denote o resultado em que a primeira moeda é cara e a segunda, coroa, e assim por diante. Assim, o espaço de todos os resultados possíveis é S = {(1, 0); (1, 1); (0, 1); (0, 0)}.
Dado que o resultado da primeira moeda é cara, qual seria a probabilidade de observarmos cara na segunda moeda também? Não é preciso ser um especialista para aceitar que o resultado da primeira moeda não altera nossas avaliações sobre a probabilidade da segunda moeda resultar em cara. Nesse sentido, dizemos que tais eventos são independentes.
Curiosamente, o conceito de independência, embora bem diferente e, em certo sentido, até mesmo antagônico ao conceito de disjunção, parece se confundir com o último. Dizemos que dois eventos A e B são disjuntos se a intercessão entre A e B for vazia, isto é, se não existir nenhum resultado em comum a A e B. Tais eventos também são chamados de mutuamente exclusivos, no sentido de que a ocorrência de um implica a exclusão do outro e vice-versa. No caso do lançamento das duas moedas mencionado acima, os seguintes eventos são disjuntos: A = evento em que a primeira e a segunda moeda são caras (A = {(1, 1)}), e B = evento em que a primeira e a segunda moeda são coroas (B = {(0,0)}). De fato, a ocorrência de A exclui a ocorrência de B, e vice-versa. Agora, estes eventos não são (em nada) independentes, pois a probabilidade da ocorrência de um, dado a ocorrência do outro, é zero – muito embora a probabilidade incondicional tanto de A, como de B seja 1/4.
Um paralelo ao processo de identificação social me parece natural. Esse paralelo sugere que a independência entre grupos sociais não implica disjunção ou auto-exclusão das características que os definem. A independência, ao contrário, pressupõe certa medida de intercessão entre as partes, em que a proporção entre a intercessão e qualquer uma das partes envolvidas é a mesma entre qualquer uma das partes e o todo. No caso do lançamento das duas moedas vemos que o evento em que a primeira moeda é cara, é independente do evento em que a segunda moeda é cara, note a igualdade entre as proporções:
Acima, Card A denota o número de elementos do conjunto A; por exemplo, Card {(1, 1); (1, 0)} = 2, pois o conjunto {(1, 1); (1, 0)} é formado de dois elementos: o par (1, 1) e o par (1, 0).
Uma forma de expressar independência numa relação implica, portanto, expressar certa medida de intercessaõ (não vazia) entre as partes envolvidas. Sob esse ponto de vista, um desejo de independência por parte de um adolescente pode ser acompanhado pelo pedido latente de inclusão de apenas uma parte (e não menos que essa parte) de suas características num determinado conjunto de valores, de tal forma que este se sinta independente dos mesmos. Muitas vezes, no entanto, a identificação é com o complemento, isto é, tudo menos o conjunto de valores proposto, correspondendo a um estado de total dependência entre as partes, como A e AC (onde AC = tudo que não pertence a A). Analisado por esse ponto de vista, o termo empregado por adolescentes “me inclui fora dessa” expressa justamente isso, o melhor “tudo menos isso”.