Cláudia Regina Santa Silva (responsável do laboratório). Participantes: Beth Rossin, Cassia Rosato, Nataly Pimentel e…
A aposta na conversação no CIEN Minas
Aline Aguiar Mendes[1]
O que falar quer dizer[2] nas conversações realizadas no CIEN Minas? Se a oferta da palavra é tomada nos dias de hoje como um instrumento em prol de uma eficácia e de uma previsibilidade do sujeito[3], o CIEN, ao promover as conversações inter-disciplinares, rompe com a resposta padrão ou da normatização, fazendo surgir a diferença e a singularidade[4].
Essa aposta decidida nas conversações e em seus efeitos, em nosso momento atual, será abordada em três conversações realizadas pelo CIEN Minas. Apresentaremos o CIEN in loco, que tem o objetivo de levar a conversação ao encontro com a cidade e, também, duas outras conversações que ocorreram na sede do Instituto de Saúde Mental e Psicanálise e sobre a medicalização nas escolas, em que contamos com professores, coordenadores e familiares e, outra, sobre o insuportável no adolescente, em que tivemos a presença de vários profissionais do campo da saúde e do direito – trabalhadores ligados ao CREAS e a instituições voltadas ao cumprimento de medidas socioeducativas e de proteção ao adolescente, um juiz da vara de infância e juventude e estudantes.
No CIEN in loco, realizado em um hospital da cidade, o Laboratório “Mães em crise” apresentou um caso paradigmático de uma questão acerca do que fazer com as mães que estão em crise num hospital. No decorrer da conversação, o impasse para a equipe pode ser localizado a partir de uma cena que se repetia na fala dos profissionais presentes. O encontro de uma mãe com uma criança de três anos trouxe um insuportável para a equipe de profissionais. Duas questões são colocadas para a equipe: o que vocês acham de uma criança visitar uma mãe em crise? Uma criança deve testemunhar a crise psicótica da mãe? A partir desse momento, os diferentes profissionais apontam situações diversas em que o encontro da mãe com a criança ora foi importante, ora foi devastador, como aponta uma psiquiatra. Não é possível, portanto, tecer um protocolo universal a ser seguido diante de uma situação que envolve uma mãe em crise em um hospital. Ao introduzir o lugar da criança no discurso, abriu-se a chance para uma proposição que implicasse outros profissionais de vários serviços da saúde e saúde mental numa construção para os impasses que viviam e não a promoção de uma resposta salvadora.
Em uma outra atividade do CIEN Minas, “O insuportável na criança e a educação: mal-estar na escola, qual remédio?”, o Laboratório “Docentes doentes: deixe-os falar” junto com o Observatório Infâncias da FAPOL fizeram uma aposta na palavra a partir do vídeo com a entrevista de Marie-Hélène Brousse sobre medicalização. Em um momento da conversação, uma professora diz: “o menino ficou dopado, mas depois ele conseguiu ler”. A responsável por animar a conversação pergunta: “esse remédio é para o menino ou para a escola?”. Um coordenador pedagógico afirma: “não é só os educadores, mas a família também não quer se a ver com o sintoma dela, que é a criança”. Depois de alguns instantes, uma mãe presente diz: “qual a responsabilidade social dos apoiadores de mães, de famílias, quando vejo que as famílias estão solitárias?”. A responsável por animar a conversação cita uma situação em que os professores se demitem de responder por algo e terceirizam sua função chamando, muitas vezes, os psicólogos. Alguns professores intervêm, citando exemplos de situações vividas sobre as quais não sabiam o que responder. Uma outra intervenção, então, é feita: “Todos estão procurando apoio e acabamos fazendo uma terceirização. A ilusão que se vende é que daí não precisamos mais conversar. E há uma demissão dos pais e professores e aí, o remédio toma corpo, vai dando apoio”. Um impasse foi localizado: o remédio é para o menino, para família ou para a escola? A palavra circula, muitos querem falar e não se demitem mais de colocarem sua implicação naquilo que fazem.
Por fim, em outra conversação, o Laboratório “Juntos e não misturados” e o Laboratório “Janela da Escuta” trouxeram a experiência, respectivamente, com adolescentes abrigadas e adolescentes que cumprem medida socioeducativa. A questão, “o que é o insuportável no adolescente?”, animou a conversação. Uma das participantes diz: “é não saber o que vai acontecer com ele”. Uma técnica das medidas socioeducativas replica: “mas esse insuportável transborda pra gente que trabalha nos serviços”. O caso, primeiramente apresentado pelo Laboratório “Janela da Escuta”, entra na conversa. Para o adolescente em questão, “ser adolescente era atuar, se envolver”, o que se evidenciava quando ficava em liberdade, fora da medida sócio-educativa. Diz: “quando estou na medida eu penso, quando tenho liberdade, não sei o que fazer”. A coordenadora do Laboratório “Juntos e não misturados” diz que há no abrigo uma superproteção por parte dos profissionais que mantêm as adolescentes no abrigo com receio de que o excedente sexual possa aparecer, se estiverem fora. Ganha espaço na conversação o mal estar dos profissionais, diante desse impasse: “o que fazer diante dessa liberdade perturbadora?”. O juiz intervém e diz: “mas de qualquer modo, a prisão é a negação de qualquer espaço”. Uma outra participante indaga: “mas a dimensão do tempo não seria mais importante que o espaço?”. A conversação avança, trazendo para o centro a questão da construção adolescente e caminha para o final quando a coordenadora do Laboratório “Janela da escuta” afirma a importância dos Laboratórios do CIEN como um espaço-tempo que possibilita o tempo da adolescência.
Como pudemos notar, o encontro com o impasse, com o que não se sabe, propicia a presença de um sopro de vida na invenção testemunhada em nossas conversações no CIEN Minas.